Você tá bem?
Olho ao redor e todo mundo parece cansado. Será que trabalhar é assim e pronto? Esta newsletter nasce para, um tópico de cada vez, investigar se dá para ser mais feliz na labuta
Esta é a primeira edição da Bem no Trabalho, a minha newsletter sobre carreira, bem-estar e conversas ou pessoas inspiradoras. Para quem como eu, está querendo descobrir novas maneiras de trabalhar, ser feliz e ter saúde. Será que dá?
Oi, você tá bem?
Não sei se você andou fazendo essa pergunta a você mesmo ou aos seus chegados ultimamente. Já tentou? Minha impressão é de que pouca gente anda se sentindo 100% bem ultimamente. Todo mundo num clima meio exausto, meio que tentando se reanimar depois de uma ressaca que ainda não sarou.
Se você sair puxando essa conversa entre seus colegas e conhecidos, vai notar palavras que se tornaram muito mais frequentes depois da pandemia. Burnout, esgotamento, exaustão, ansiedade, depressão: termos relacionados à saúde mental caíram na boca do povo e viraram parte do cotidiano de quase todo mundo.
Eu achava que ia ser diferente; ainda lembro bem daqueles anos pandêmicos, trancados em casa com medo de morrer e perder entes queridos. Aprendemos tanta coisa né? A trabalhar de casa, a lembrar de ajudar as pessoas que passam fome, a cuidar melhor da saúde, a valorizar as coisas mais simples da vida ..
Parecia óbvio que a partir dali a coisa ia dar uma melhorada, não parecia?
Pois nada óbvio. Menos de quatro anos depois daquele 11 de março de 2020 em que a Organização Mundial da Saúde anunciou que o surto do coronavírus fdp tinha virado oficialmente uma pandemia, sobrou pouca novidade em relação ao que éramos antes da Covid-19.
Ocorre que, para mim, mudou bastante coisa. Trabalhadora workaholic apaixonada pela minha profissão que sou, faz duas décadas que trabalho alegremente fechada em grandes escritórios, sem reclamar. Amarradona.
Toda atividade que não era remunerada eu tentava encaixar no que sobrava do meu dia fora as 8 horas de trabalho (10, se somarmos o deslocamento e tal, ou 12, 14, dependendo do noticiário da semana): atividade física, outros temas sobre os quais eu quisesse aprender, ver meus amigos, visitar minha família em outro Estado, estudar música, praticar artes, escrever para projetos pessoais… tudo MESMO ficava para depois. Para um dia, quem sabe, na aposentadoria. Sem data definida.
Não à toa essas outras áreas ficavam estagnadas, ano após ano: sempre deixei, com muito fervor, toda a minha energia e minha paixão nas paredes dos escritórios em que eu trabalhei.
Você tá com energia?
“Ligia, você coloca toda a sua energia no trabalho”, me disse, em uma das inúmeras sessões que eu fiz nos últimos anos, a minha terapeuta.
A entonação da voz dela dava àquele comentário um ar de reprovação, como o de quem está tentando dar a dica de que eu me beneficiaria bastante se conseguisse melhorar esse aspecto da minha personalidade.
Eu, incrédula e sem entender onde ela queria ir com o rumo daquela conversa, perguntei, com uma curiosidade sincera, nada irônica e constrangedoramente inocente:
“Ué, mas existe outro jeito de trabalhar?”
Se você me perguntasse nas últimas duas décadas, eu sempre estive bem no trabalho, em uma posição bastante privilegiada até: me mantive empregada neste mundo cão e competitivo do jornalismo na cidade grande, em empresas sólidas e renomadas, trabalhando na profissão que eu escolhi, crescendo, aprendendo e me divertindo. Ser jornalista é bom demais. Estava tudo certo.
Mas alguma coisa aconteceu. Para além dos sentimentos da pandemia dos quais eu ainda lembro e eram tão intensos - a vontade de aproveitar a vida quando todo mundo fosse vacinado, a ânsia por ter mais contato com a natureza, a importância que eu passaria a dar para a minha saúde, a pandemia me trouxe mais uma novidade: a experiência de trabalhar de casa moveu placas tectônicas dentro de mim que nunca mais voltaram para o lugar.
De repente eu vi que, organizando bem organizadinho, era possível que eu conseguisse fazer tudo: ser excelente no trabalho, coordenar minha equipe, conversar com fontes e, assim que o expediente acabasse, começar uma atividade física virtual. Sem trânsito, sem medo de assalto. Eu comecei a conseguir limpar minha própria casa e comer a comida que eu mesma cozinhava, bem mais saudável e boa que a dos quilos. A ter a companhia dos meus cachorros 24 horas por dia.
Sendo uma adepta das experiências remotas para (quase) todos os propósitos, eu descobri que eu podia colocar em prática sonhos que eu vinha adiando desde que nasci rs - estudar piano, aprender a pintar, fazer pilates e ioga regularmente. Tomar sol nas pernas de manhã para reavivar a minha vitamina D, sempre tão cronicamente baixa conforme me alertavam os médicos diante do meu bronzeado pálido das redações.
Não parou por aí: eu descobri que, após uma vida inteira sendo uma clássica “piá de prédio” (gíria do Paraná), com medo de inseto e principalmente de sapos (sou hater de sapos), nasceu dentro de mim uma grande necessidade de ter um quintal para respirar fora de casa. Lembrei que antes de ser jornalista eu gostava de olhar para o céu à noite e ver estrelas, de ouvir barulho de grilo e dar oi pra algum passarinho que viesse fazer uma visita.
É estranho admitir, mas eu mudei, fazer o quê. As pessoas mudam. O que é para eu fazer com tudo isso agora? Fingir que nada rolou neste meu proletário coração?
Será que foi só comigo que rolou tudo isso?
O que é estar bem?
O conceito de ser feliz ou estar bem no trabalho é totalmente dos tempos atuais e de pessoas da minha geração em diante (de geração X que se identifica como millenial, rs): meus ancestrais, bisavós, avós e pais apenas trabalhavam muito, quase sempre sofrendo, para fazer o que tinha que ser feito e sobreviver. Não tinham opção.
Estar bem no trabalho pode ter significados diferentes para cada pessoa: em um cenário mais simples, por exemplo, é quando tudo está certo: você está mandando benzão, seus chefes te amam, seus clientes não te trocam por ninguém; você é o famoso foguete que não dá ré, de que tanto falam no Linkedin, Eba, parabéns! Nada para debater aí.
Pode também, sob outro recorte, significar que você está em paz com o que a vida lhe oferece: o trabalho tem dias melhores e piores, mas a rotina parece fazer sentido, dá para pagar os boletos e tá tudo bem. Tem tanta gente sem emprego nesse país, você reconhece o privilégio. Não é tudo perfeito, mas você não sofre mais do que é capaz de suportar. Bom também!
Mas a minha versão preferida da expressão bem no trabalho é a que puxa um papo mais profundo, uma boa pauta para conversa de bar: Você está bem e trabalha? Você está bem e continua bem enquanto está trabalhando? Você lembra da segunda-feira de trabalho no domingo à noite e fica bem? Você trabalha bem e chega bem em casa? Seu trabalho te dá sustento, com pouco sofrimento?
Se você estiver com tempo, deixa seu palpite aqui?
Bastante gente está doente
Adoecer no trabalho (ou por causa dele) têm se tornado tão comum no Brasil que o Ministério da Saúde precisou atualizar para o 2023 pós pandêmico a lista que reúne todas as doenças relacionadas ao trabalho.
Entre as patologias presentes na nova lista estão o burnout (também conhecido como síndrome do esgotamento profissional), a ansiedade, a depressão e a tentativa de suicídio.
O levantamento inclui também comportamentos como o uso de sedativos, canabinoides, cocaína e abuso de cafeína; são transtornos que, na nova visão do Ministério, podem ser consequência de jornadas exaustivas, assédio moral no trabalho ou dificuldades da cultura organizacional.
Pesado, né?
E essa newsletter?
Deixa eu me apresentar direito. Sou Ligia Guimarães, nasci no Paraná e vim para São Paulo há quase 20 anos para trabalhar como jornalista. Fiz MBA em economia e trabalhei por longos períodos no G1, no Valor Econômico e na BBC News Brasil, onde fui editora. Coordenei este ano o Curso Valor de Jornalismo Econômico, um programa voltado a formar jovens jornalistas. Já contei todo tipo de história em texto, vídeo e áudio; dediquei grande parte da minha carreira aos temas sociais, e sou apaixonada pela minha profissão. (Olha um pouco do meu trabalho aqui: reportagens Ligia )
A verdade é que, desde janeiro de 2022, tenho pensado muito sobre o trabalho, e todos esses questionamentos que eu listei aí em cima. Desde então eu tenho buscado me informar: fiz terapia, procurei uma coach, escrevi diários, ouvi podcasts, li livros. Mas ainda tenho muitas perguntas que não sei responder:
- quem não é herdeiro vai precisar voltar a trabalhar presencialmente?
- trabalhar menos e ser feliz é uma utopia, e trabalhar tem que envolver todo o seu tempo, vida e recursos? Lembrei desse vídeo da Miranda Papo de RH em dezembro
- pensar tudo isso não adianta nada e é coisa de gente que está precisando achar um terreno para carpir?
Ando com vontade de conversar com mais gente (e matar minhas saudades de escrever regularmente): quem sabe se eu trouxer o que tenho lido, aprendido e pensado ajudo você a repensar algumas coisas por aí também?
Então, o combinado é o seguinte: a cada 15 dias eu vou escolher um tema relacionado a trabalhar e a estar bem e contar um pouco do que tenho pensado; cada um deles vai ser baseado nesta minha jornada pessoal (que ainda está rolando, aberta e com bastante trabalho enquanto isso rs).
O enterro do home office
R.I.P - Eu me recuso a ir a esse velório, mas tá sabendo que o home office morreu? A Você S/A colocou até o caixãozinho na capa e diz que úmero de dias da semana em home office caiu 40% no mundo, e quase 50% no Brasil, desde 2022. Entre as novas vagas, a imensa maioria é totalmente presencial. Diz que a bola da vez é a semana de quatro dias.
Inveja da firma - O New York Times diz que a aposta das empresas é tornar os escritórios cada vez mais instagramáveis para atrair os jovens. Como tudo o que tem um apelido maneiro é mais legal, eles estão chamando de Envy Office (algo como escritório da inveja) : o que acontece quando as empresas tentam aliar o conforto de uma sala de estar ao glamour das férias.
Ganhar menos e trabalhar menos - Já conhece a Quiet Ambition? Em nome de uma vida mais saudável e equilibrada, mais gente está fugindo de cargos de liderança. A Forbes diz que é um movimento tem ameaçado a carreira corporativa como a conhecemos, baseada em promoções como incentivo constante
Mas vamos relaxar um pouco
Sou viciadona em entrevistas (tanto em entrevistar quanto em assistir/ouvir, principalmente de mulheres) e sempre aprendo alguma coisa interessante com elas.
Adorei essa fala aqui da Ivete Sangalo sobre sucesso e saúde mental em entrevista ao Quem pode, Pod (ela é muito engraçada e eu adorei ouvir tudo, mas se quiser só esse trechinho começa no 1h36”:
“O que é o sucesso, é o olhar do outro ou o seu olhar sobre a sua vida? Tem que prestar atenção nisso. Hoje, nos tempos de hoje, a nossa maior riqueza é a nossa saúde mental. Mais do que dinheiro, do que qualquer outra coisa. É mesmo, do ponto de vista de sobrevivência. Se essa coisa da lei da evolução, dos homo sapiens, do que sobreviveu, isso exigiu uma estratégia de sobrevivência. Antes era o homem que corria mais, que era mais forte, que consumia mais carne, deve-se a estratégias de sobrevivência que vão lhe manter vivo. Hoje, a estratégia é essa”. (Ivete Sangalo)
Também recomendo, para fins de inspiração para mentes cansadas, esta dica fofa de outra mulher que vale a pena escutar: a Samantha Almeida, diretora de criação e conteúdo da Globo e uma das maiores profissionais de inovação do país.
"Eu ensino para as pessoas que eu amo uma coisa maravilhosa que é assim: faça o seu PPT da vida. O que você quer? O que você sonha? O sonho mais doido que você não tem coragem de falar. Se não mexe com PPT, escreve no seu bloco de notas o que você quer para você. Se a gente não consegue materializar esses desejos, eles se perdem". (Samantha Almeida)
Aqui o vídeo em que ela dá a dica. Gostou? Bora montar esse PPT dos seus sonhos secretos pra 2024?
Escrever, no PPT ou no bloco de notas, aliás, pode ser muito terapêutico para descansar a cabeça.
Na próxima edição te conto mais sobre o que eu aprendi sobre isso.
Fica bem, hein
Beijos e até a próxima,
Ligia